Ritalina e outros tratamentos farmacológicos: quando as soluções são escondidas pela desinformação
Apesar da reconhecida elevada prevalência do diagnóstico de Perturbação de Hiperatividade e Défice de Atenção (PHDA), o recurso a consultas de Psiquiatria da Infância e da Adolescência (PIA) por esta suspeita tem vindo a aumentar, traduzindo certamente um maior reconhecimento deste diagnóstico. E se, por um lado, este enquadramento promove uma maior procura de cuidados especializados e, portanto, uma melhor evolução, por outro terá talvez contribuído para uma certa hipervalorização de comportamentos normativos.
À semelhança do que acontece numa grande parte dos quadros em saúde mental, a PHDA caracteriza-se por sintomas que, numa amplidão de situações, correspondem a comportamentos normativos, expectáveis e adaptativos. A infância é um período da vida caracterizado pelo permanente assombro perante o mundo, natural curiosidade e constante exploração. Estas características, típicas de um desenvolvimento saudável, traduzem-se numa maior atividade motora e natural inquietude, que não devem ser confundidas com sintomas patológicos desta perturbação, que ocorre quando estes assumem uma intensidade ou frequência não esperada para a idade, trazendo prejuízos nos seus contextos pessoal, social ou académico, e que não são nada menos do que a manifestação de uma disfunção neurofisiológica.
O tratamento desta perturbação tem a importantíssima capacidade de limitar défices e favorecer um neurodesenvolvimento normal, com menos fragilidades no funcionamento do indivíduo e, assim, indiretamente, tem o papel de permitir ao indivíduo cumprir todo o seu potencial, que se reflete não só em questões académicas, mas também familiares, relacionais e sociais.
A melhor intervenção em PHDA deve sempre contemplar uma abordagem psicossocial, mas, perante o seu reconhecido efeito sinérgico, poderá apenas ser otimizada quando utilizada em conjunto com a terapêutica farmacológica (em situações selecionadas). Apesar dos riscos associados, os fármacos utilizados (em Portugal comercializados sob o nome comercial de, p.ex, RitalinaÒ ou ElvanseÒ) tratam-se de substâncias amplamente estudadas e com riscos extensamente investigados. Quando aplicados sob acompanhamento médico regular, com monitorização apertada, ultrapassam em cerca de 80% as situações os riscos que lhe são inerentes.
Apesar de frequentemente diabolizada, conotada como uma solução fácil, a terapêutica farmacológica é, frequentemente, em conjunto com as intervenções comportamentais, um salva-vidas para os indivíduos que, perante este diagnóstico, apresentam défices em todos os seus contextos de vida. É através do seu tratamento que se torna possível a estas crianças e adolescentes manter um percurso de vida sem défices executivos permanentes, pautado por relações sociais e familiares saudáveis e harmoniosas, cumprir os seus objetivos académicos e profissionais de forma correspondente a todo o seu potencial e, em última instância, usufruir do seu melhor autoconceito e qualidade de vida, livres de complicações na sua saúde mental.
Catarina Esteves Ferreira
Psiquiatria de Infância e da Adolescência
mim – Clínica do Desenvolvimento