Com muita frequência encontramos artigos que orientam os pais a desenvolverem as chamadas “boas práticas parentais”. Eu próprio já os publiquei. No entanto, numa análise aos mesmos, verificamos que estes estão recheados de regras, obrigações, procedimentos e muitas outras sugestões focadas na resolução, ou antecipação, de hipotéticos problemas. Mas, com isto, estamos a moldar pais e mães genuínos ou meros cumpridores de normas impostas sem uma permissão prévia?
Nos dias de hoje, ser pai e ser mãe é, de facto, um grande desafio. Não porque o ser humano tenha desenvolvido em poucas décadas comportamentos radicalmente novos e necessidades únicas nunca antes observadas, mas porque a sociedade evoluiu repentinamente em direção a uma competitividade desenfreada, castradora de espontaneidades e formatadora de seres rentabilizadores. Hoje encontramos pais-professores, pais-vigilantes, pais-motoristas, pais-treinadores, pais-informáticos… pais cansados! Tudo isto sob o pretexto de preparar os mais pequenos para o futuro.
Em milénios de história, as sociedades e as pessoas que as compõem adquiriram os valores humanos que nos permitiram evoluir até aos nossos dias através do exemplo, do convívio e, fundamentalmente, do amor no seio familiar, da moralidade que carateriza cada família e cada comunidade, da consciência coletiva. Mais do que pedir aos pais que ajudem os filhos na realização dos trabalhos de casa, que os orientem na preparação para os momentos de avaliação, que os levem a fazer desporto ou que monitorizem os seus momentos de lazer, precisamos de pedir aos pais que se dediquem aos seus filhos com tempo, serenidade, livres de obrigações, com programas variados e sem a constância das responsabilidades acrescidas.
É sabido que as crianças passam demasiado tempo em torno das novas tecnologias, que cada vez mais são menos autónomas e que têm dificuldade em cumprir regras, em ser tolerantes e em saber estar socialmente. É sabido que cada vez mais exigimos aos pais que assumam a responsabilidade de monitorizar estes espetos na vida dos seus filhos, mas também é sabido que cada vez mais os programas escolares obrigam as crianças a passar mais tempo na escola e que a competitividade laboral obriga os pais a estarem constantemente ligados ao seu local de trabalho. E o contrassenso reina.
Não será reduzindo o tempo em família, aumentando o tempo na escola, introduzindo conteúdos programáticos dúbios e carentes de enquadramento académico, que iremos formar cidadãos. Teremos uma sociedade mais respeitadora, mais tolerante e mais humana, dando-lhe oportunidade para o convívio, enriquecendo-lhe as agendas culturais, incentivando a qualidade televisiva, promovendo hábitos de leitura, dando espaço e tempo para se ser, para se conviver, para se amar!
Urge assentirmos que as famílias formem as gerações mais novas para os princípios humanos fundamentais. Urge permitirmos pais-livres! Urge encontrarmos pais-Pais!
Paulo R. C. Coelho
Psicólogo da Infância e Adolescência
mim – Clínica do Desenvolvimento